quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

MUDANÇA E VARIAÇÃO NO PORTUGUÊS DO BRASIL SÃO TEMAS DE ESTUDO EM ESCOLA DO CAMPO DE VEREDINHA-MG


Vamos conversar um pouco sobre a nossa Língua Portuguesa Brasileira? Já parou para pensar na diversidade de falares que a nossa língua possui? Já parou para pensar que quando falamos não utilizamos, de fato, todas as regras e recursos que compõem a chamada língua padrão? Analisando esses aspectos, a Escola Família Agrícola de Veredinha promoveu alguns debates e reflexões sobre mudança e variação linguística nas aulas de Língua Portuguesa, nas turmas do 1º Ano do Ensino Médio. Os conteúdos propostos que favoreceram as discussões foram a História da Língua Portuguesa e a Fonética e a Fonologia.
No processo de estudar a história da nossa língua, perceberam-se as drásticas mudanças ocorridas em diversas palavras ao longo do tempo. Um dos exemplos estudados foi a palavra “você”, a qual passou por um contínuo processo de transformações. No início era “vossa mercê”, depois “vossemecê”, “vosmecê”, “vancê” . Contudo, o mais interessante nessa história toda foi o aprendizado de que não há nenhum problema no fato de a língua mudar – e, entre outros, quem nos recorda disso é o linguista Sírio Possenti. Segundo ele, “[...] não há língua que permaneça uniforme. Todas as línguas mudam”.
Já no estudo da fonética e da fonologia, ressaltando que os estudantes são oriundos de diferentes comunidades, foi possível perceber a diversidade linguística presente no próprio espaço da sala de aula. Acima de tudo, eles atentaram para o fato de que nas diferenças linguísticas estão marcadas, também, diferenças identitárias e históricas. E isso corroborou com  considerações já realizadas de Calvet sobre as relações entre variações e mudanças na língua e questões sociais. Ressalta-se, nesse sentido, o entendimento do autor de que  “[...] as línguas não existem sem as pessoas que as falam, e a história de um língua é a história de seus falantes”.
Ao investigarem algumas mudanças ocorridas na fala e que refletem no processo da escrita, os estudantes foram percebendo a sonoridade das letras e, na composição das sílabas, notaram que determinados fonemas são poucos perceptíveis ou mesmo ausentes na fala cotidiana. Alguns exemplos destacados foram as ditas semivogais, em alguns contextos linguísticos, e também alguns dígrafos. O contraste percebido em palavras como ameixa (‘amexa’)/ e agulha (‘aguia’)/trouxe a reflexão de que, algumas vezes, uma grafia incorreta explica-se pela baixa frequência, ou mesmo ausência, na fala cotidiana, de alguns sons que costumamos atribuir a certas letras. Escrever ‘aguia’, nesse sentido, seria tentar transpor em letras todos os sons que, muitas vezes, são, de fato, ouvidos cotidianamente pelo estudante na pronúncia da palavra ‘agulha’.
O momento de estudo proporcionou uma aproximação carinhosa com os falares dos avós e dos bisavós e a percepção de diferentes formas de apropriação da língua. apropria-se da língua tanto somente pela audição, nas mais diversas práticas diárias com a linguagem, quanto se apropria também  pelo processo da escrita, que possui regras específicas. Isso, entre outras possibilidades. Levou-se, também, à discussão do preconceito linguístico sofrido pelas populações camponesas.
Os estudantes pesquisaram algumas palavras nas comunidades e fizeram uma troca de experiências em sala de aula, no sentido de explicitar os sentidos atribuídos a variados termos em cada comunidade. Constam abaixo algumas dessas palavras:
Comunidade
Termo ou expressão
Sentido
Comunidade Alagadiço
Deixar de “asnidade”
Deixar de ser besta
Bentinho
 “Fingir de égua”
Fingir de bobo
Ribeirão Veredinha
“Pricipiço”
Problema. Ex: ‘vai arrumar pricipiço’ - vai arrumar problema.
Cáquente
“Manaíba”
Pessoa boba demais
Cáquente
“Micha”
Pessoa metida
Veredinha
“Binguelando”
Balançando
Veredinha
Passar na “pinguela”
Passar na ponte
Fanado Amanda
“Chibiu”
Chuchu
Cuba
“Mandô falá”
Retornar uma ligação
Veredinha
“Tá dumm!”
Referência a algo que está em excesso. Exemplo: ‘o calor tá dumm’ - o calor está excessivo. 
Tatu
“inverem”
Duvidoso. Ex: ‘isso tá inverem’ - isso está duvidoso.

Dentro disso, pôde-se perceber no processo que o ensino da Língua Portuguesa é algo amplo e que não deve se restringir às regras gramaticais. As relações identitárias passam pelo uso da língua e compreendê-la dentro dessa amplitude é fundamental. A boa escrita de um texto, antes de tudo, revela o entendimento do mundo e da realidade.
 Escrito por Neltinha Oliveira dos Santos